Poucas coisas causam tanto furor na minha vida quanto a véspera do lançamento desse CD.

Ansiedade só comparada, talvez, ao dia de pagamento e à espera pela mesa naquele restaurante bom quando você já tá cheio de fome e arrependido de não ter ido no Bob’s comer uma batata murcha que já tá ali te esperando.

Pra 2024, a expectativa valeu a pena. Que disco BOM. Sambas muito qualificados, envelopados por uma grande gravação – muito, mas MUITO, superior à do primeiro grupo.

Não que isso seja novidade; a partir de 2015, pelo menos, a superioridade do CD da Liga RJ, tanto em termos de safra como de registro, é regra, não exceção.

Acredito, inclusive, que esse é o melhor disco do grupo desde 2017 – meu favorito em muito tempo.

Dito isso, comento brevemente minhas primeiras impressões sobre cada um dos DEZESSEIS sambas da Série Ouro – ainda é “Série Ouro”? – pro próximo carnaval.

UPM. Parece que o vice – mais um! – em 2023 deu tão certo que a escola resolveu repetir rigorosamente todos os passos pra tentar o enfim acesso pro grupo especial. O samba animado e funcional sobre um enredo nordestino, com leve jeitão de São Paulo, é um. A gravação é ótima, com destaque praquela sanfoninha marota. Que Padre Cícero interceda!

Inocentes de Belford Roxo. Vocês conhecem a trend do sapato errado? É uma moda entre influenciadoras de lifestyle, que montam looks inteiros numa pegada e usam o sapato oposto à proposta – vestido de festa com tênis de academia, por exemplo. O samba da Inocentes é mais ou menos isso: a letra tá indo pro bar, mas a melodia tá vestida prum batizado.

Império Serrano. A cada intérprete histórico da escola que somava ao alusivo – samba de 92, que escolha – eu dava um grito. Bom DEMAIS, um dos momentos altos do CD. Sobre o samba, não chega a ser destaque, mas é bom.

Império da Tijuca. Bate uma nostalgia forte quando começa o Vem ver minha escola ensaiando, e toda Tijuca cantando/Vem ver, meu amor, vem ver. E o cavaco – as cordas são um destaque na faixa – ainda ensaia um Vai tremer. Baita subida! Sobre o samba: é ok, com duas grandes ressalvas: a mudança de letra no primeiro refrão é muito confusa, e a segunda parte simplesmente NÃO ACABA.

Niterói. O Red Bull Bragantino da Sapucaí. Chegou do nada, já é rico e tá nas cabeças. Gosto muito do Catopês, gosto da faixa; o único porém é a interpretação do bom Tuninho Júnior, um pouco abaixo da média do CD.

União da Ilha. A escola tava devendo um samba minimamente decente desde que caiu. Pra 2024, se o escolhido não é um primor, pelo menos já é superior aos dos anos anteriores. Gosto muito dos dois refrões; desgosto de outros trechos – aquele O cacheado é a coroa da princesa soa pra lá de forçado, e o fechamento abrupto de melodia em Baobá/Seu legado é imortal é feião.

São Clemente. Admiro a coragem.

Estácio de Sá. O melhor samba da Estácio em anos. De forma geral, a letra é muito boa e a melodia mescla muito bem momentos valentes e mais animados. E, claro, o refrão de cabeça é um ACHADO. Samba que certamente é destaque na safra. No mais: o desnível entre os intérpretes é evidente, e o andamento que o mestre Chuvisco costuma imprimir tira muito o brilho do samba no ao vivo.

Bangu. Existe gravação de samba-enredo e existe isso que Bangu fez aqui; que faixa ESPLENDOROSA. A subida é coisa de maluco, a virada pra segunda com os pratos é doideira e o Igor Vianna só falta fazer chover feijoada. O samba por si só nem é um primor, mas eu tô entregue. Falar de São Jorge é covardia.

Vigário Geral. Parece que imaginar encontro entre santos tá na moda no Acesso – pra mim, 100% de aproveitamento. A letra do samba é muito boa, e a melodia tem grandes momentos. O único porém é aquele trecho do progresso pelos trilhos – que além de ser um baita chavão, destoa muito do todo. E, ó: Danilo Cezar é CRAQUE. Que interpretação do homem.

Ponte. Eu sei que sou suspeito pra falar, mas a verdade é: a Ponte tem o melhor samba e o melhor intérprete do grupo. Não fosse Bangu, teria a melhor faixa também.

Arranco. Que baita acerto falar de Nise da Silveira. O samba soube tratar o enredo, que não deixa de ser obscuro, com afeto e ludicidade – como bem propôs a escola. Desde que voltou pra Sapucaí o Arranco jamais errou.

Em Cima da Hora. Ainda tô tentando me entender com esse samba.

Sereno de Campo Grande. Como é bom ouvir 100% Sereno de Campo Grande no disco de acesso. E em seu retorno a escola emplacou um enredaço: a festa de Santa Bárbara e Iansã na Bahia. O tema deu num samba competente, de ótima letra e melodia animada, com bons momentos. Larga bem na batalha pela permanência o Sereno.

União de Maricá. Tenho opiniões sobre Maricá. Não vou falar nenhuma, mas tenho.

União do Parque Acari. O samba funcional e animadão pra falar do bloco Ilê-Aiyê resultou numa DELÍCIA de faixa. Os instrumentos de sopro – proibidos na hora do vamo ver – dão um molho todo especial pra gravação. Leozinho e Tainara tão entrosadíssimos. Resta saber se a escola sustenta esse nome até o carnaval.

By Thales Basilio

Thales Basílio é editor e redator, formado em Relações Internacionais e Estudos Estratégicos pela UFF com pesquisa em carnaval carioca. Desde 2022 integra o time da Bicuda.

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