Foto: Alexandre Loureiro/Riotur
Em noite de gala nos desfiles da Liga RJ, mais 6 escolas se apresentaram em busca do sonhado acesso ao grupo especial, além de Bangu, que fez um grandioso desfile mesmo após o incêndio que destruiu metade de suas fantasias, e o Império Serrano, que fechou o carnaval com um dos momentos mais emblemáticos dos 41 anos de Sambódromo. Confira como cada escola se apresentou.
Retornando à Marquês de Sapucaí após um hiato de incríveis 11 anos, a Tradição surpreendeu a todos com um desfile acima das expectativas. Bastidores davam conta de que a escola estava tendo problemas com fantasias momentos antes do desfile começar, mas todos parecem ter sido resolvidos. O abre-alas do Condor era imponente e muito bem realizado, e a plástica da escola manteve o bom nível. Destaque também para o excelente samba da azul e branca, que venceu o Estandarte de Ouro – você viu primeiro aqui que a Tradição tinha o melhor samba do grupo. A condução do bom Tuninho Júnior embalou uma harmonia segura, melhor que a vista nos ensaios técnicos. De senões, a comissão de frente da escola, que teve um desenvolvimento confuso, e a apresentação do enredo, muito repetitiva em se tratando de um tema tão abordado em desfile de escola de samba. Agora, o ponto alto do desfile da Tradição rolou antes dele começar: que esquenta INCRÍVEL. Aquecer com Sonhos de Natal e Silvio Santos não é pra qualquer um.
A próxima escola a se apresentar foi a União do Parque Acari, que, em seu segundo ano de grupo acesso, preparou um simpático enredo sobre o violão. O carnavalesco Guilherme Estevão preparou um desfile de fácil leitura e com bom nível plástico, tanto em fantasias como em alegorias – que eram grandes, criativas e estavam muito bem acabadas. O novo casal da Acari, Renan Oliveira e Laís Lúcia, trajava um belo figurino e fez uma apresentação segura, corrigindo o que foi um dos calcanhares de Aquiles da escola em 2024. De negativo, pode pesar a ainda frágil harmonia da escola e a bateria dos mestres Erik Castro e Daniel Silva – que se enrolaram com a harmonia da escola para apresentar suas bossas no setor 3. De todo modo, Parque Acari demonstrou franca evolução de um ano para o outro e também não deve correr riscos na apuração.
Terceira escola da noite, a Vigário Geral trouxe um irretocável enredo sobre Francisco Guimarães, o Vagalume, para o centro da rua mais importante do mundo. Preto, filho de ex-escravizados, Francisco se tornou redator e colunista de jornal ainda jovem e foi o primeiro a falar de samba e carnaval na imprensa carioca, na virada dos séculos XIX para XX. A comissão de frente da escola fez um excelente uso da iluminação da Sapucaí, com bailarinos que acendiam e utilizavam lanternas para imitar, claro, o efeito de vagalumes voando. Os estreantes carnavalescos Alex Carvalho e Caio Cidrini entregaram um enredo de fácil leitura e uma apresentação de alto nível plástico. A bateria de mestre Luygui melhora a cada ano, e teve ótima passagem pela pista.
A quarta escola a se apresentar foi a Unidos de Bangu. Nas arquibancadas, o comentário era que a escola, mesmo após o incêndio, parecia mais inteira que as coirmãs. De fato, os banguenses fizeram um desfile muito digno para ecoar a luta da aldeia Maracanã, com boa defesa de quase todos os quesitos. Destaque absoluto para a comissão de frente, que trazia uma constituição que se abria em led e mostrava palavras de ordem e registros marcantes da luta indígena, e para o último setor da escola, com uma ala formada por integrantes da aldeia e faixas com reivindicações.
Quinta escola a se apresentar, a Porto da Pedra mostrou porque estava no grupo especial em 2024. Impressionante a inventividade de Mauro Quintaes, especialmente com enredos de apelo popular. O abre-alas da escola trazia uma escultura de um Henry Ford fantasmagórico, que do alto do carro ditiva ordens para uma centena de operários representados como ratos – uma alusão não sei se à Maus, de Art Spiegelman, ao Seminário dos Ratos, de Lygia Fagundes Telles, aos dois ou à nenhum. A última alegoria tinha, à frente, duas plantas comendo a bandeira norte-americana, representação da floresta devorando o sonho Yankee. Impressionante, também, a vitalidade de Wantuir, que liderou com maestria o canto gonçalense. O Tigre pode ser despontuado, talvez, em comissão de frente – de novo o uso de um grande elemento alegórico que não se justificava -, e em casal – quesito mais frágil da GRESUPP. Com tudo isso, impossível não citar a Porto da Pedra como postulante ao caneco.
Com um enredo sobre os animais e a relação de carinho entre os pets e seus humanos, a São Clemente foi a sexta agremiação a se apresentar na segunda noite de Série Ouro. Muito já se falou sobre o complicado desenvolvimento do enredo da escola e a fragilidade do conjunto alegórico clementiano – especialmente por conta do último carro, talvez o mais feio do grupo. Mas eu sou do time que achou o desfile da amarelo e preto simpático. Ele conseguiu o que dificilmente uma escola do grupo de acesso consegue: identificação com o grande público. Desfile de escola de samba deve, sempre, ser pensado para ser entendidos por todos que o assistem, e quanto mais elementos de identificação, melhor. Com uma excelente comissão de frente – tirante o fato de ter se apresentado somente para o lado dos jurados -, um bom conjunto de fantasias e uma harmonia surpreendente, puxada pela melhor apresentação da carreira do mestre Marfim, a São Clemente definitivamente não foi o desastre ventilado por aí.
Última escola a se apresentar pra valer, a Acadêmicos de Niterói, sob batuta de Wallace Palhares, ex-Presidente da Liga, demonstrou que aprendeu com seus erros e criou maturidade em seus dois anos de grupo de acesso – e existência. Tudo começou com uma comissão de frente que trazia um bonito e grande tripé que efetivamente contribuía para a apresentação – uma caminhão que levava os quadrilheiros por aí e que, durante a performance para o júri, virava um salão de baile. O abre-alas da azul e branco era imponente e de concepção irretocável, prenunciando o bom conjunto plástico da escola. A harmonia da comunidade niteroiense, problema histórico da agremiação e de sua antecessora, Sossego, foi correta, puxada por mais uma excelente interpretação para o currículo de Nêgo. O único fator de preocupação é o primeiro casal da escola, que se apresentou inseguro e com dificuldades de sincronia em alguns movimentos. Se nos anos anteriores Niterói fazia um desfile certinho, mas frio, o que a distanciava das primeiras posições, em 2025 esse detalhe não existe. A escola é sim postulante ao caneco.
E, por fim, o Império Serrano. O Reizinho de Madureira comprova aquilo que o professor Luiz Antônio Simas adora repetir: existem escolas que existem porque desfilam e escolas que desfilam porque existem. O Império é uma das maiores entidades culturais do planeta e participar ou não de um concurso de melhor escola ano após ano é só um mero detalhe; ele é maior que isso. Que outra escola peitaria o certame e faria uma roda de samba, na Sapucaí, durante o desfile, incluindo o povo do arrastão, só com seus sambas emblemáticos? Não há outro comentário a se fazer: GRÊMIO RECREATIVO ESCOLA DE SAMBA IMPÉRIO SERRANO.
Palpites
Se é para cravar, eu cravo na União de Maricá pelo título. Foi a escola que, pra mim, teve o melhor desenvolvimento de enredo e melhor conjunto plástico, com defesa homogênea de quase todos os demais quesitos.
Meu desfile favorito, porém, foi o da Estácio. A escola fez o que fez na miúda, com metade – ou menos – da verba das outras favoritas.
Porto da Pedra e Niterói – que teve incríveis 3 subvenções – devem fechar o primeiro pelotão, e não seria injusto se levassem o caneco. Vigário completa meu top 5.
Ilha, Tradição e Acari ficam pela meiuca da tabela, e São Clemente fecha o grupo das escolas que não deveriam passar sustos.
Na minha avaliação, Botafogo e Inocentes deveriam cair. As duas vão sofrer penalidades e ainda devem ser despontuadas no quesito enredo – Botafogo por passar com “quatro” alegorias devido aos problemas de acoplamento do abre-alas e Inocentes por não ter entrado com o tripé da comissão de frente. A Em Cima da Hora, que teve uma evolução conturbada e estourou o tempo em 2 minutos, e o Arranco, por ter feito uma defesa frágil de diversos quesitos, também podem acabar voltando para a Intendente.